Está cada vez mais difícil ter um relacionamento nessa era
de redes sociais. Se for analisar um gráfico de casamentos pós-feicebuqueanos
vai ver uma queda de causar inveja a qualquer empresário com predileção ao
fracasso. Não digo necessariamente por causa do ciúme, do ser amado exposto,
dos urubus e das cadelas que circundam o que era para ser só nosso. Isso é o de
menos, ciúme sempre existiu.
Penso mais pelo como as pessoas estão mais desinteressantes
ultimamente. Estão não, sempre foram apenas não haviam ferramentas necessárias
para expor tamanha falta de senso, elegância e outras bilongas mais.
Você conhece a moça na fila para comprar cerveja num bar
enquanto rola uma musica gostosinha. Ela é bem vestida, arrumadinha,
cheirosinha, uma graça. Vocês começam a conversar despretensiosamente sobre um
assunto qualquer. Futebol, por exemplo. Mulheres que entendem de futebol um afrodisíaco
alucinante. Papo vai, papo vem e você descobre que ela curte Chico Buarque,
torce para o mesmo time que o seu, bebe da sua marca preferida de cerveja,
adora Woody Allen e acha Almodovár meio forçado. Tá aí, você encontrou a sua
cara metade. Se fosse na década de 90, você pediria o telefone para continuar
esse papo num lugar mais reservado, a chamaria para comer uma pizza e ver algum
filme meio boboca no pretexto de algo a mais. Hoje pedir pelo telefone é quase
uma preliminar para casamento e por achar a menina tão interessante você não
quer sufoca-la “vai que eu deixo passar a mãe dos meus futuros cachorrinhos
(criança não me apetece) por afobação?”. Telefone agora virou quase o último
degrau antes de um namoro, aliás, eu conheço um casal que estão juntos a 6
meses e ainda não sabem qual é a voz no telefone do outro. Na verdade, eles só
tem o telefone um do outro por causa do whatsapp ou do bbm. Primeiro pede-se um
contato na rede social, sentiu confiança e cumplicidade? Pede o whatsapp?
Manteve contato? Começa a mandar mensagem? Se apaixonou? Telefona. Conheço
pessoas que não sabem o que fazer quando o telefone toca, bate um desespero,
parece alarme “e agora, fodeu?!”, parece
o “Valendo!!!”do Gugu na Banheira. Ligar para dar boa noite não é mais fofo,
rapazes, é over. Aliás, outra aulinha do que é in ou out, usar palavras da
língua inglesa no meio da frase é cool, mas cuidado para não ficar fake. Voltando,
uma escapatória para manter o contato sem parecer desesperado é perguntando
como encontro na rede social mais famosa, daí saca o celular e pede para a
menina te adicionar, o que também evita um constrangimento (como se pronuncia
Suellyn? Vem cá, seu nome não tem na lata de coca zero não, tem?) e mantém um
clima de flerte no ar...e aí, quero ver achar minha foto. Funciona, vai por
mim.
Se antigamente, você pegaria, no dia seguinte, o pedacinho de guardanapo com o telefone dela
anotado com aquela letrinha amistosa da caneta roubada do bartender, hoje você
espera a manhã do dia seguinte para curtir alguma foto que ela postou no
banheiro do bar da noite passada com as amigas. Só para começar a mostrar
interesse. Não há mais aquela regrinha de esperar 36 horas (24 horas era muito
cedo, você gostava de um suspense, e 48 horas era muito tarde, mostraria perda
de interesse e quem pede, recebe, quem se desloca, ganha preferência, lembra?).
Depois daquele um dia e meio, você pegaria seu telefone (fixo), discaria para
casa dela, torceria por nenhum parente atender antes (lembra do mini-infarto
quando era uma voz de homem que atendia e depois do seu pedido para falar com a
moça recebia um sonoro “Quem quer falar?”, dava um frio na espinha, e quando a
pessoa, com quem você realmente queria falar, atendesse,você tinha que
recuperar daquela gagueira momentânea).
Caso quisesse
privacidade para aquele seu papo informal pelo telefone, você pegaria a sua
linha longa e carregaria até o quarto, até para não atrapalhar a sua avó que
tava vendo a novela dela no canal 4, quando eu digo vendo, entenda roncando.
Naquele ambiente, iria descobrindo aos poucos quem era aquele ser que queria
conquistar, decifrar. Certas coisas só se descobriam perguntando como
aniversário, irmãos, trabalho. Não havia um mural com essas informações te
explicitando tudo. Nada era redundante, tudo era novo. Na verdade, você poderia
fazer o personagem que você quisesse. Ligava-se as 22 para pagar menos e desligava
meia-noite para dormir, senão chegaria atrasado na escola/faculdade/trabalho
dia seguinte, e naquelas 2 horas (quando havia assunto e sorte), a atenção de
um era só do outro, olha que coisa démodé?! No máximo rolava uma música de
fundo, ou o barulho da televisão que se abaixava para ouvir a pessoa melhor, “ah
também to vendo esse programa!” era típico.
Hoje não é bem por aí que o bonde anda. Você adicionou, ela
te aceitou. Oba, primeiro obstáculo vencido. Dia seguinte ela tá on e a sua
bolinha também esta verde na barra lateral do bate-papo. “E aí, chegou bem?”
sempre quebra o gelo. “Oi, você é aquele menino que conheci no bar ontem, né?” pode
rolar também. Até aí tudo bem, ela é tão gracinha que você chega a achar doce
as imagens de auto-ajuda que ela posta no mural de cinco em cinco minutos. Na
sua prateleira tem um livro do Caio Fernando Abreu que você ganhou de
aniversário daquele seu amigo que faz letras e teatro, como ela posta frases
dele e da Clarice Lispector o tempo todo você pensa que ela tem um bom gosto
literário. “Adoro o CFA, acho que ele deveria escrever um livro ou então ter um
vlog ou blog...”tudo bem, releva. “Sobre a Clarice, acho que já vi ela no Jô ou
no programa da Gabi.” Literatura não é o forte, de boa.
Vamos pra cinema, tem várias fotos de frases com o Charlie
Chaplin, ela deve curtir cinema preto e branco também. “Me amarro nele, qual é
aquela frase que ele sempre diz mesmo?” Tipo o bordão, você quer dizer? Vamos
para as fotos dela. Quantas fotos de noitada tirada dos sites das festas,
quantas fotos auto-tiradas de banheiro, toda arrumada, quantas legendas “Pre-pa-ra”
(tenho certeza de que daqui a duas semanas esse comentário, não vai fazer
sentido, mas hoje faz, assim como ontem “Sou foda” era maior sucesso.) Esquece
as fotos, foca na conversa. Ela é tão bonitinha, mas só escreve em caixa alta,
e como ela conseguiu essa letra rosa no bate-papo, e para que tanto carinha
assim? Ela é formada em arquitetura, como ela passou na prova de redação
escrevendo “Amu”, “Axu”, “Keru”, quem corrigiu a monografia dela, Jesus
Cristo?! Tiririca? Não há conheço faz
mais de 12 horas e já sei (porque vi fotos, várias fotos) de tudo que ela comeu
desde que acordou, sei todas as sensações físicas e pensamentos que passa pela
cabeça dela de 2 em 2 minutos, não só eu, 887 pessoas também. Não consigo
entender como essa Irmã Zuleide ou Gina Indelicada são tão engraçada assim, mas
pela cumplicidade parecem que escrevem sobre a vida dela. Eu não acredito que
ela goste de Sertanejo Universitário. Antigamente as pessoas escondiam seus
pensamentos profundos e segredos num diário debaixo do colchão. Hoje em dia
quanto mais curtidas melhor.
Aceitaria tudo isso e a chamaria para sair se ela não
insistisse no check-in “Minha humilde residência”. Deu, vou deletar, bloquear,
cancelar assinatura. E a igreja preocupada com o casamento gay, deveriam
apoiar, pois se não for por ele, ninguém mais financia o matrimônio. Eu,pelo
menos, quero evitar o risco das fotos minhas com o padre fazendo mustache no Instagram.